Enviado por msorianoneto@hotmail.com
O vocativo
usual nos discursos de Getúlio Vargas, “Trabalhadores do Brasil!”, representava
uma fórmula positiva de contato político, por tornar emblemático um atributo que
expressava a corresponsabilidade do povo com o desenvolvimento do País. Fazia o
ditador uma cooptação da sociedade, a fim de manter com ela um ‘diálogo produtivo’, pois, em contrapartida, o povo
reconhecia-se um ‘interlocutor’, mesmo que só se restringisse à
síntese de suas emoções:”Pai dos
Pobres!”, “O Bom Velhinho!” O
vocativo getulista incorporava todas as categorias, sem a exclusão
discriminatória desta ou daquela profissão, deste ou daquele ofício.
Opostamente,
João Goulart, nos seus pronunciamentos, dividia o povo em subclasses de
trabalhadores, somente reconhecendo como tais, os sindicalistas, os operários,
os metalúrgicos e, da parte hierárquica das Forças Armadas, soldados, sargentos
e marinheiros. Era norma, nos seus discursos, exortar esses setores, não para
acentuar-lhes a sua importância no desenvolvimento da Nação, mas para
desestruturá-la, principalmente por meio da indisciplina na caserna, visando à
anarquia e, por conseguinte, à instituição de um regime de força. Pretendia
arrebanhar para as suas hostes o proletariado e os militares que considerava
suscetíveis de qualquer ato indisciplinar.
Para Jango,
essas eram as classes populares. Quanto aos demais
trabalhadores contribuintes e empresários que sustentavam economicamente o seu
governo, não preenchiam os inflamados discursos, a não ser como alvo de sua ira,
insuflado pelo arruaceiro cunhado Brizola. Para ele, agricultores não eram
trabalhadores, mas as ligas camponesas, sim.
Eis
que se encontra na END um rastro do discurso janguista, discriminador,
dissimulado e, como tantos outros trechos, malredigidos
(assim
mesmo). Numa das passagens referentes a O serviço militar obrigatório; nivelamento
republicano e mobilização nacional, diz: “É importante para a defesa nacional que o
oficialato seja representado de todos os setores da sociedade brasileira. É bom
que os filhos de trabalhadores ingressem nas academias militares. Entretanto, a ampla representação de
todas as classes sociais nas academias militares é imperativo de segurança
nacional”.
O que mais
realça no trecho citado é o “nivelamento
republicano”, característica das
esquerdas brasileiras de manter fidelidade a pensamentos próprios dos
antiquários ideológicos, quando insinua (“É bom, etc..”) que não são filhos de
trabalhadores os jovens cadetes em preparo ao oficialato, em outros tempos, e
atualmente. Isso já ocorre, senhores redatores, o fato é que desconhecem a
origem de considerável parcela de cadetes, provindos de todos os estados do
Brasil, mas que lhes fazem pensar, pelos conhecimentos adquiridos nas Academias
Militares, pela educação recebida, característica da caserna, serem oriundos da
“elite”, da “burguesia”, permanentes chavões da insidiosa esquerda, de cuja
agremiação sinistra, muitos, sim, são oriundos das camadas mais bafejadas da
sociedade.
O que
desejavam imprimir neste falacioso documento, mas evitaram pô-lo às claras, é o
ingresso facilitado de filhos de sindicalistas, de sem-terra, de sem-instrução,
sem a devida observância de concurso e de outros pré-requisitos indispensáveis à
manutenção da hierarquia e da competência do comando. Hierarquia e disciplina
são palavras ofensivas aos revolucionários, infelizmente, de posse do governo,
de posse do MD. São ávidos pelo “nivelamento republicano”, por
baixo.
Pôs-se em
negrito, a conjunção adversativa, cuja função, na estrutura da língua, é a de
introduzir um pensamento que se opõe ao anterior. Desta maneira, “Entretanto” desmonta todo o palavrório
do período antecedente, por ignorarem um dado gramatical elementar de que um pois
ou um porque, antecedido de vírgula,
resolveria a questão da lógica semântica. Mesmo assim, permaneceria a acusação
de que, com o presente esquema de ingresso nas Academias, não está sendo “imperativo” a segurança nacional,
quando, na realidade, esta segurança está sendo postergada pelo governo, único
responsável pela impatriótica inércia.
Em
continuação ao item citado, e que se refere à “Segurança Nacional”, diz o texto: “Duas condições são indispensáveis para que
se alcance esse objetivo [Segurança Nacional]. A primeira é que a carreira militar seja
remunerada com vencimentos competitivos com outras valorizadas carreiras do
Estado”, o que torna premente o pagamento dessa maravilhosa remuneração, a
fim de que ponham em prática, de imediato, a segurança deste território, já que
”vencimentos competitivos” e “segurança”, segundo faz parecer, no
documento, são, respectivamente, causa e consequência. Talvez, habituados que
estão os componentes deste governo de trabalharem (?) à custa de generosos
contracheques, considerem os militares à sua semelhança. Felizmente, ainda se
pode dizer que não chegaram a tal deformidade
moral.
Pela
manutenção dos irrisórios vencimentos dos militares, o que se evidencia, em
contraponto a esta veemente afirmação de bons estipêndios, é que tudo ali,
naquele ministério, é uma grande mentira, inclusive, a defesa do país. Ou,
pode-se entender, por outro lado, que tais vencimentos robustos só sejam pagos
quando as Academias Militares forem apenas compostas de sindicalistas,
operários, etc., sem concurso ou por cotas, para a segurança do próprio governo
petista. Aliás, em várias partes da END essa relação entre “remuneração” e
“classe trabalhadora” é enfatizada, na formação das Forças, como neste trecho:
“Essa é uma das razões [provir da
classe trabalhadora] pelas quais a
valorização da carreira, inclusive em termos remuneratórios, representa
exigência de segurança nacional.”
Continua o
documento mais hipócrita da “história deste país”: “A segunda condição é que a Nação abrace a
causa da defesa e nela identifique requisito para o engrandecimento do povo
brasileiro”, assertiva que alterou a disposição dos termos, devendo, ao
contrário, ser a “Nação” o foco de
engrandecimento pela ação de o povo abraçar a ideia de defesa: [“A segunda
condição é que o povo brasileiro
abrace a causa da defesa e nela identifique requisito para o engrandecimento da
Nação.”]
O hábito de
encher as bochechas com a palavra “povo” e o desábito de falar em “Nação”
levaram os malabaristas da pobre retórica marxista a inverter, no papel, o valor
político dos termos, como é de praxe a inversão de valores na escolha de
ministros, assessores, nesta doente república.
Até o
presente momento não se fez divulgar publicidade institucional do MD nos meios
de comunicação, para que o povo “abrace a causa da defesa”, conscientizando-se
da necessidade de o Brasil proteger-se. Essa lerdeza de ação governamental
resulta da paralítica ideia de que “somos
pacíficos”, outra repetição enfadonha, aqui e ali, preenchendo o vazio da
escritura mal-alinhavada da END.
Essa ‘conversa’ com a sociedade, também ocorrerá (usa-se, aqui, o tempo verbal
preferencial dos redatores), quando os logísticos, os mobilizadores, os
estrategistas, enfim, os teóricos do ministério entravado, acordarem do sono
irresponsável, próprio dos sem-planejamento. Aí, SERÁ tarde
demais!
(*Prof.ª Dr.ª em Língua Portuguesa. Articulista do
Jornal Inconfidência. Membro da Academia Brasileira de Defesa. A opinião
expressa é particular da autora.)
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